quinta-feira, setembro 15, 2011

AVALIAÇÃO DAS ESCOLAS EM CABO VERDE: UMA PRIORIDADE PRIORITÁRIA (I)


As escolas só sabem para onde vão, se dispuserem de instrumentos que lhes permitam, em primeiro lugar, conhecer-se, saber o que são e para onde vão

Augusto Santos Silva



Uma parte significativa das escolas anda ao sabor dos ventos e apresenta, por isso, dificuldades acrescidas em saber com exactidão quem são, onde estão e aonde pretendem chegar. Ou seja, ao desconhecerem a si próprias ignoram, também, por completo, as suas potencialidades, ameaças, pontos fortes e fraquezas, etc. Razões que as torna, segundo Sun Tzu, na Arte da Guerra, frágeis perante os seus eternos adversários: o insucesso, o abandono e a expectativa desproporcional da sociedade.

Ao longo desta análise procuramos viajar, na companhia do leitor, pelo mundo das escolas, com a evocação das razões porque devem produzir conhecimento sobre si próprias, antecipando as dificuldades e contribuir para uma discussão fundamentada em torno da (auto) avaliação como ferramenta essencial para melhoria das instituições e organizações educativas, especialmente aquelas que tendem a sobreviver independentemente do seu êxito.

Existem muitas visões (embora desfocadas) e percepções sobre a avaliação dado que diariamente avaliamos, ou seja, emitimos juízos de valor sobre diferentes fenómenos e ocorrências. Contudo, neste espaço defende-se a operacionalização de conceito para que o autor e o leitor debrucem sobre a (auto) avaliação das escolas com a possibilidade de haver pontos de convergência e, quiçá, divergência, mas sem nunca perdermos o foco: a melhoria das escolas.

Fronteira Conceptual

A avaliação (das escolas) constitui a formulação de um juízo de valor ou de mérito sobre o funcionamento das escolas com recurso a instrumentos científicos, com o propósito de produção de informação credível que permite aos decisores a possibilidade de tomarem decisões fundamentadas. O que distingue e credibiliza a avaliação das outras unidades de medida tende a ser a sua eterna e perpétua vontade de superação dos pontos fracos e de manutenção dos pontos fortes das organizações sejam elas escolares, religiosas, políticas, empresariais, etc. Conforme a seguir se indica, são inúmeras as virtudes associadas à avaliação das escolas.

Prestação de Contas e Transparência

Baseada no princípio do direito à informação, há um escrutínio atento e exigente sobre as actividades desenvolvidas pela escola, tendo em conta que esta é obrigada a prestar regularmente contas sobre o seu funcionamento, quer para o público interno (comunidade educativa) quer para o público externo (sociedade).

Ademais, a necessidade de transparência dos resultados visa, por um lado, enaltecer as boas práticas de gestão e, por outro, sancionar os infractores em caso de exercício doloso na gestão da coisa pública dado que as escolas, sobretudo as públicas, são custeadas pelos impostos pagos pelos contribuintes.

Substituição do Controlo a Priori pelo Controlo a Posteriori

Uma aposta na avaliação das escolas, permite, outrossim, que haja um controlo a posteriori sobre os resultados em vez do controlo a priori baseado nas normas. Esta questão tende a ser de extrema importância na medida em que evita que os líderes se preocupem com questões, por vezes, menores (como, por exemplo, marcar falta a certos professores, revistar os contentores de lixo, vigiar certos professores e funcionários tidos como rebeldes, fazer o culto da arrogância, entre outros pecados) em vez de concentrarem nas estratégias de melhoria da escola dado que esta deve ser o cerne da mudança (o farol da sociedade).

O exercício de funções periféricas por parte dos líderes, de um modo geral, e dos gestores escolares, de forma particular, revela a ausência de uma visão clara para a instituição que dirigem o que, bastas vezes, provoca a desorientação dos membros da comunidade educativa que, ao centrarem o seu foco nos feitios (e fraquezas) do líder, prejudicam o ambiente escolar devido ao efeito de dissonância que tal desconforto provoca, conforme elucida Daniel Goleman e colaboradores, na obra “Novos Líderes: a Inteligência Emocional nas Organizações”.

Convergência Normativa e Técnica com a União Europeia

No âmbito da parceria especial com a União Europeia impõe-se a Cabo Verde uma aproximação normativa e técnica - a diversos níveis e domínios. A avaliação da escola é uma realidade na maioria dos países europeus (embora a diferentes velocidades) o que nos obriga a ser eclécticos, ou seja, a tirarmos antecipadamente partido das boas práticas (incluindo europeias) a favor da melhoria das escolas em vez de assumirmos uma postura reactiva e céptica até que nos impõem, de forma forçada - do género da Tróica - uma agenda sem margens, portanto, de negociação. Ademais, há directrizes do Parlamento Europeu e do Conselho da União Europeia sobre a cooperação europeia em matéria de avaliação da qualidade do ensino básico e secundário.

Credibilização do Discurso das Organizações

A avaliação das escolas credibiliza o discurso das próprias organizações escolares e do Estado sobretudo quando se cultiva o hábito saudável da triangulação de dados e/ou da informação que permite que quaisquer iniciativas de avaliação (neste caso interna) sejam complementadas por outras visões (de preferência distanciadas), evitando, assim, práticas monoculturais da avaliação.

Travões e Alavancas na Avaliação das Escolas

Apesar das virtudes acima enunciadas da avaliação das escolas, a sua não implementação (resistência) deve-se a muitos fenómenos previsíveis e, por vezes, invisíveis: o desejo da não responsabilização das escolas (omissão do ónus); a preservação do Status Quo organizacional; o privilegiar das mudanças de primeira ordem que em nada contribuem para o fortalecimento das organizações; o desconforto do avaliado, que associa a avaliação unicamente ao controlo (dimensão psicológica). Contudo, a avaliação quando planeada com rigor e executada de forma prudente tem a finalidade de melhorar os pontos fracos e de contribuir de forma sustentada para a manutenção dos pontos fortes das organizações dado que, por exemplo, as boas escolas não são de geração espontânea: são semeadas.

Desafios

A formação constitui uma via segura para que, a par e passo, se interiorize no seio das escolas as vantagens da avaliação interna. Consideramos, por isso, fundamental para o patamar de desenvolvimento almejado para Cabo Verde – decorrente dos desafios nacionais e compromissos internacionais - munir a administração pública, de uma forma geral, e as escolas, de forma particular, de ferramentas de gestão que as permitam no momento da tomada de decisões - que se deseja fundamentada - substituir o conselho prudente baseado na confiança e, por vezes, “boa fê” pela informação relevante baseada em informação credível.

A defesa legítima da avaliação das escolas e das organizações apresenta, por último, uma dimensão política pelos valores da democraticidade e participação que promove. Assim, a assumpção de visões holísticas e sistémicas alicerçadas no esforço concertado deve ser o caminho para a mudança e florescimento da inovação no seio das organizações para que não tenham que “inventar a roda” a cada recomeço…


Albino Luciano Silva

Mestre em Educação (esp. Administração e Organização Escolar), Pós-graduado em Gestão e Avaliação da Formação, Licenciado em Ciências da Educação e autor do livro: Auto-Avaliação da Escola e Desenvolvimento Institucional.

In Jornal, semanário Asemana, edição número 1000, 09 de Setembro de 2011.

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