sexta-feira, novembro 26, 2010

A QUALIDADE DA EDUCAÇÃO EM CABO VERDE: DO ENSINO BÁSICO AO UNIVERSITÁRIO

Se te sentares a descansar à beira do caminho, vira-te de frente para a parte que te falta andar e de costas para o que já andou

Provérbio chinês


A qualidade do nosso sistema educativo é um tema que nos preocupa a todos, de uma forma ou de outra, porque dela depende, em grande parte, o “salto” que o país precisa dar para se afirmar como um País, realmente, de Rendimento Médio.

Sempre que se faz referência ao nosso estado de crescimento e/ou de desenvolvimento, implicitamente vem a comparação com os países menos avançados, caso, por exemplo, dos países africanos de língua portuguesa, acrescentando Timor. Pelo contrário, a comparação da performance do nosso país, em geral, ou sistema educativo, em particular, deverá ser feita de forma inteligente com países que apresentam índices elevados em vários critérios de análise, nomeadamente no desempenho dos alunos nas disciplinas nucleares ou clássicas (como a língua materna ou oficial, a matemática, etc.); na taxa de sucesso de escolar; na motivação docente e não docente para o exercício da profissão; na avaliação de desempenho do pessoal docente e não docente e; sobretudo na competência demonstrada pelos alunos no final de um ciclo de estudos, entre outros. Sem estes parâmetros, torna-se difícil deduzir, com responsabilidade (e alguma objectividade), sobre a qualidade de um dado sistema ou subsistema educativo, em comparação com o de outros países, sejam eles pobres ou ricos.


No programa televisivo da TCV, Conversa em Dia, de 23 de Agosto de 2010, apresentado pela jornalista, Rosana Almeida, foi emitido uma peça jornalística em que o Doutor Corsino Tolentino, comentador televisivo e Ministro da Educação entre 1984 a 1990, defendeu que o ensino em Cabo Verde não tem “qualidade”, sobretudo, o subsistema do ensino superior. Nesse dia, no estúdio, estavam dois convidados, Reitores das Universidades de Cabo Verde e de Santiago que, face à afirmação do Doutor Corsino Tolentino, justificaram a falta de qualidade no ensino superior como consequência das deficiências existentes no ensino secundário, sobretudo na sua fase de desemboque no ensino superior. No rescaldo da entrevista, o Ministro da Educação e Desporto, Octávio Tavares, repudiou a ideia da falta de qualidade da educação em Cabo Verde, considerando a afirmação típica de quem se encontra “longe da sala de aula”.

Uma análise distanciada do problema da qualidade da educação (ou da sua avaliação) requer, primeiro, que se compreenda o conceito. Assim, de acordo com o Dicionário de Língua Portuguesa (2010), a qualidade é entendida como uma propriedade ou condição natural de uma pessoa ou coisa que a distingue das outras. No sistema educativo, a qualidade reporta-se ao padrão de conhecimentos, comportamentos, sociabilidade, moralidade e operacionalibilidade que a escola inculca nos seus utentes. Assim, os intervenientes na discussão sobre a qualidade, antes de qualificarem o sistema como tendo ou não qualidade, devem operacionalizar o conceito de modo a certificarem de que falam do mesmo fenómeno. Feitas estas considerações, propomos com o presente artigo esgaravatar o interior do nosso sistema educativo, à procura de elementos para propiciar um debate fundamentado em torno da Qualidade da Educação em Cabo Verde: do ensino básico ao universitário.


Ensino básico: a espinha dorsal de qualquer sistema educativo

Um dos elementos para uma interrogação fundamentada sobre a qualidade no ensino básico, sobretudo após à introdução de reformas que visaram a massificação do ensino, consiste em saber se existe, na prática, a passagem automática no primeiro ciclo do Ensino Básico Integrado, EBI, dado que, oficialmente, é negado esse princípio. Todavia, sabe-se que, na Educação e noutras áreas da actividade humana, as coisas nem sempre acontecem como deviam acontecer e, por isso, fala-se nas lógicas de acção organizacional. Esta inquietação surge com intuito de perceber a existência de estratégias geradoras de falso sucesso que, na prática, permitem os alunos transitarem de ano sem atingirem os pré-requisitos necessários. Este facto penaliza os alunos no final de um ciclo de estudos e, muitas vezes, o preço é pago durante uma vida inteira através de uma leitura deficiente do mundo e da palavra.

Apesar da língua portuguesa ser oficial no sistema sócio-politico cabo-verdiano, verifica-se, à vista desarmada que, do básico ao superior – tendo pelo meio o secundário -, os docentes, na sua grande maioria, não apresentam competências linguísticas desejáveis. Esta realidade é bastante gritante porque acaba por abranger muitos graduados na língua portuguesa. Os efeitos tornam-se evidenciáveis, por um lado, na qualificação dos formandos que transitam de ano sem o nível de proficiência desejado, resultando consequências nefastas para outras unidades curriculares. Outrossim, nota-se, por um outro lado, que uma percentagem significativa de cidadãos acaba por exercer uma “cidadania desmoralizadora”, não sendo interventivos nem participativos, devido, muitas vezes, à falta de domínio das ferramentas linguísticas.

Ensino secundário: entre a formalização da culpa ao básico e a desculpa ao universitário

No secundário, a análise da qualidade obriga-nos a atender ao antes e depois da reforma curricular que introduziu a massificação do ensino que, como todas as reformas, tem os seus efeitos secundários ou danos colaterais. Assim, importa de forma específica atender os seguintes casos de alunos:


a) Os da pré-reforma do ensino secundário, ou seja, que acediam e concluíam o Ano Zero, actual décimo segundo, em menor número, mas que os melhores, ou seja, com médias finais a partir de 14 valores conseguiam vaga e bolsa para formação, nas universidades estrangeiras. Estes regressados ao país, laboram, hoje, sem grandes reparos, nas mais diversas instituições e empresas públicas e/ou privadas, nacionais e estrangeiras. A bolsa atrás referida acabou por ser considerada fundo perdido, segundo uma directiva recente do actual governo;


b) Os da reforma educativa que concluem com sucesso o terceiro ciclo do secundário, ou seja, o 12º Ano, e optam pela formação no exterior, em parte, motivados pela representação social de que o canudo conquistado “fora” confere maior visibilidade e prestígio social;

c) Os que não conseguem ir para a formação no estrangeiro e optam pela oferta nacional. Nesses casos, importa analisar a, pelos menos, duas situações que se distinguem pela sua natureza: de um lado, a dos alunos que fazem prova de ingresso ao ensino superior e, com mais ou menos dificuldades, entram na universidade pública; de outro lado, a dos restantes alunos que, basta terem dinheiro para propina, entram em qualquer curso nas sete instituições de ensino superior privadas actualmente, existentes no país.

Porém, em ambos os casos referidos na última alínea, a entrada na universidade faz-se, muitas vezes, sem a observância do nível de proficiência minimamente exigido numa academia de referência, ou seja, sem saberem devidamente ler, escrever, expressar (em português e/ou crioulo), a par de fraquezas notórias nas competências sociais básicas, nomeadamente ao nível do saber ser e do saber estar.


Ademais, em Cabo Verde, foi dada demasiada autonomia às escolas privadas e a ausência de um quadro regulatório produziu, por um lado, uma concorrência desleal com a escola secundária pública devido à inflação dos resultados dos alunos que tende a não corresponder, em exacta medida, às competências que se suspeitam apresentar os alunos da escola pública e, por outro, existem práticas promíscuas que, nalguns casos, encontra-se sob a investigação do ministério público.

Ensino superior: entre a formação das elites e banalização pedagógica

Num artigo recente Promiscuidade Pedagógica e Qualidade do Ensino (Jornal Asemana, Ano XX, edição nº 937, de 18.06.10), apontamos uma série de situações pouco abonatórias para o serviço docente no ensino superior em Cabo Verde, alertando para as consequências nefastas que tais práticas produzem, a prazo, para o país, dado que um dos indicadores da qualidade do ensino superior tende a ser os seus quadros, conforme diz o adágio popular pela aragem vê-se [ou melhor, infere-se, com maior ou menor grau] quem vai na carruagem.

A sistematicidade dos fenómenos educativos leva-nos a afirmar, a grosso modo, que um outro indicador do padrão de qualidade do ensino superior tende a ser os alunos que se lhes chegam do ensino secundário (com ou sem prova de ingresso), com maior ou menor apetência para o esforço e aposta voluntária na auto-formação, em vez do refúgio preguiçoso na hetero-formação. Conquanto, a eficácia de uma instituição de ensino (que nunca é semelhante porque as escolas, na verdade, fazem a diferença) pode ser medida pelo seu valor acrescentado nos alunos, independentemente da sua origem social e escola anteriormente frequentada.

À procura de uma conclusão

Qualquer discurso sobre a qualidade da educação não deve ser definitivo em si mesmo, mas tema de vários escrutínios, a fim de encontrar mais elementos para uma conclusão bem alicerçada, objectiva e esclarecedora. Ademais, em Cabo Verde, qualquer discurso veiculado pela comunicação social, sobretudo pela televisão, carece de um juízo fundamentado, dado que ainda o país, sobretudo a sociedade civil, não apresenta estruturas de referência na formulação de decisões, aconselhamentos, pareceres e apoios aos decisores e formuladores de políticas públicas em matéria de educação.

Consequentemente, apesar dos avanços significativos alcançados em matéria da educação em Cabo Verde nestes 35 anos da independência política, conforme ilustram as estatísticas internacionais, carecemos ainda de associações de pais e encarregados de educação, de centros de estudos especializados e de sociedades profissionais cabo-verdianas capazes de desconstruírem os discursos oficiais e dos líderes de opinião de forma a serem facilmente compreendidos pelo grande público de que nos fala o sociólogo Dominique Wolton na sua obra Elogio do Grande Público.

Assim, ao fazermos qualquer comentário, avaliação ou balanço sobre a qualidade do nosso sistema educativo, devemos atender à sabedoria milenar chinesa, segundo a qual, a parte do caminho que nos resta andar deve ser sempre o nosso foco e não o já percorrido. Embora, a este respeito, Joseph Shumpeter, reputado economista e antigo professor da Universidade de Harvard, alerta-nos que o carro com o espelho retrovisor tende a ir mais longe; ou seja, a reflectir, andando estaremos mais próximos de ser um país cuja qualidade de ensino (se for bem aprimorada) será o nosso passaporte para uma distinção, com mérito, no panorama internacional.

Albino Luciano Silva

Mestre em Educação (esp. Administração e Organização Escolar), Pós-graduado em Gestão e Avaliação da Formação e Licenciado em Ciências da Educação.
E-mail: s_albino21@hotmail.com; Blog: edukamedia, disponível em http://www.edukamedia.blogspot.com/


Artigo publicado no semanário ASemana, Sexta-feira, 26 de Novembro de 2010, Ano XX, Nº 960, edição impressa e online em 29 de Novembro.

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quinta-feira, novembro 04, 2010

Autoridades espanholas investigam caso da criança de 10 anos que foi mãe

Notícia TSF


Hoje às 10:51

A procuradoria de Sevilha (Espanha) e o Defensor do Menor anunciaram a abertura de investigações sobre o caso da menina de dez anos que foi mãe no dia 26 de Outubro num hospital espanhol.

As investigações foram anunciadas depois do caso ser conhecido publicamente, na quarta-feira, com as televisões espanholas a recolherem imagens da família da menor que foi mãe no hospital de Jerez de La Frontera (Cádiz). Segundo as autoridades, o pai é um jovem de 13 anos de idade.

De acordo com as autoridades regionais, as investigações decorrem numa altura em que a família continua sem consentir o acesso à menina por parte dos serviços sociais, que tentaram na quarta-feira aceder à casa onde vive.
No caso da investigação da procuradoria de Sevilha, o objectivo é saber se a menina esteve escolarizada durante os últimos meses em que viveu em Espanha, é natural da Roménia, e se recebeu assistência médica adequada durante a fase final da gravidez.
Os pais seriam os responsáveis caso esses cuidados não tenham sido prestados, segundo fontes judiciais.

No caso do Defensor do Menor (figura que zela pela salvaguarda e promoção dos direitos dos menores) a investigação pretende estudar em detalhe o caso da menina e, em paralelo, avançar com uma campanha que explique os riscos da maternidade em idades tão jovens.

Este caso já provocou um amplo debate na sociedade espanhola, com as noticias a suscitarem centenas de comentários nas redes sociais e nas páginas dos principais órgãos de informação.

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